Como evitar prejuízos na ruptura societária?

A ruptura societária ou saída de sócios é sempre um desafio para as empresas/sociedades. Inicialmente, temos que distinguir entre as sociedades anônimas e as sociedades limitadas. 

Como a sociedade anônima é a sociedade de capitais por excelência, ou seja, na qual a identidade do sócio/acionista é irrelevante, o acionista não tem direito a pedir a dissolução parcial da sociedade, como ocorre na sociedade de pessoas. 

Na sociedade anônima, o direito de retirada tem que ser fundamentado e ele somente pode ser exercido nas hipóteses previstas nos incisos I a VI e IX do art. 136 da Lei nº 6.404/76 (emissão de ações preferenciais, aumento de ações preferenciais em desproporção às demais classes, alteração das preferencias e outras condições das ações preferenciais, redução do dividendo obrigatório, fusão, cisão da companhia e a incorporação da companhia em outra sociedade, participação em grupo de sociedades (“grupo de direito”) e mudança do objeto social).  

Já na sociedade limitada, a qual normalmente é uma sociedade de pessoas, ou seja, em que a identidade do sócio é fundamental, além de hipóteses de exercício motivado do direito de retirada (art. 1.077 do Código Civil), o sócio tem também o direito de exercer o direito de retirada a qualquer tempo se a sociedade for por prazo determinado (art. 1.029 do Código Civil) e, portanto, de pleitear a sua dissolução parcial.

Assim, como visto acima, na sociedade anônima, as hipóteses de ruptura societária são bem reduzidas. Como a sociedade anônima normalmente possui lucros e reservas (de lucros e de capital), as sociedades anônimas normalmente têm os recursos necessários para pagar o reembolso pelas ações de um ou mais acionistas que venham a exercer o direito de retirada.  

A única reserva que não pode ser utilizada para fins de pagamento do reembolso é a reserva legal (parágrafo 5º do art. 45 da Lei nº 6.404/76). Normalmente, salvo de outra forma prevista no estatuto, o reembolso será pago com base no valor contábil (parágrafo segundo do art. 45 da Lei nº 6.404/76) ou no valor patrimonial a mercado (parágrafo 3º do art. 264 da Lei nº 6.404/76).

Apesar de o problema da ruptura societária ser maior para as sociedades limitadas, há recomendações válidas para ambos os tipos de sociedade. A mais fundamental delas é tratar do assunto “reembolso” tanto no estatuto como, eventualmente, num acordo de acionistas. 

Como dito acima, este tema é ainda mais importante nas sociedades limitadas porque determinadas situações (falecimento, por exemplo), pode ensejar o pagamento do reembolso.   Assim, a primeira recomendação é prever adequadamente o critério pelo qual se dará o reembolso e o prazo durante o qual tal reembolso será pago.  

No caso das sociedades limitadas, as quais estão sujeitas ao direito de retirada tanto motivado (art. 1.077 do Código Civil) como imotivado (art. 1.029 do Código Civil) e, portanto, de dissolução parcial, o critério atualmente consagrado pelo STJ tem sido o valor patrimonial a mercado, ou seja, apura-se um valor de liquidação da sociedade, considerando-se os ativos intangíveis e o valor de venda dos demais ativos, trazendo-se os passivos a valor presente, ou seja, caso todos eles fossem pagos antecipadamente numa determinada data.  Este balanço especial é também chamado de balanço de determinação.

Assim, para evitar prejuízos, uma sociedade limitada deve constituir reservas de lucros para arcar com eventuais hipóteses de exercício do direito de retirada e de falecimento de um determinado sócio. Além da escolha do critério (econômico, patrimonial a mercado ou outro), é importante estabelecer um prazo razoável para o pagamento do reembolso, ou seja, um pagamento em parcelas mensais, de modo a não afetar o fluxo de caixa da empresa.  

Uma vez pago o reembolso das quotas do quotista retirante pela sociedade, tais quotas deverão ser extintas com a redução do capital social (parágrafo primeiro do art. 1.031 do Código Civil).   Uma alternativa ao reembolso pago pela própria sociedade é se estabelecer que os demais sócios tenham a faculdade de pagar o reembolso, ficando, assim, com as quotas do quotista retirante. 

Se, por um lado, esta alternativa desonera a empresa/sociedade, por outro lado ela pode provocar uma diluição ou modificação da composição societária entre os quotistas remanescentes.

Outra medida que vem sendo utilizada é a contratação de apólices de seguro de vida para o pagamento do reembolso de quotas no caso de falecimento de sócios. A apólice de seguro de vida substituiria a necessidade da formação de reservas de lucros pela sociedade para cobrir tal despesa.

Este breve artigo trata dos prejuízos financeiros, ou seja, de como obter os recursos necessários para pagar o reembolso das quotas de um sócio que veio a falecer, por exemplo. 

Entretanto, dependendo do sócio-quotista que queira se retirar da sociedade ou que venha a falecer, a sociedade em si pode vir a se tornar inviável.

Nestas hipóteses em que a atividade da sociedade é extremamente dependente do sócio-quotista que está se retirando, a solução será a dissolução total da sociedade, o que se formaliza mediante a assinatura de um distrato do contrato social.

Apesar do interesse coletivo na preservação da empresa, há situações em que infelizmente a melhor solução é a sua extinção.

Laercio Pellegrino
laercio.pellegrino@tagdlaw.com

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