Com a digitalização dos negócios, os países viram um enfraquecimento em sua soberania fiscal e muito se discutiu acerca da tributação da renda na nova era digital, a consequente erosão das bases tributárias e alteração do lugar onde os lucros eram tributáveis para países com baixas alíquotas de imposto de renda.
Assim, em 2013, iniciou-se o projeto Base Erosion and Profit Shifting – BEPS da OCDE, com 15 ações, visando evitar a dupla não tributação, a elisão e a evasão fiscal bem como o descasamento das normas de tributação internacional que permitiam organizações estruturais com baixa tributação ainda que lícitas.
Poucos anos depois os relatórios finais foram liberados. Porém os desafios perduram até hoje.
Nesse contexto estão em discussão os Pilares 1 e 2. O Pilar 1 visa redistribuir frações específicas da renda tributável para jurisdições de mercado, resultando em ajustes na alíquota de imposto efetiva, impactos nos acordos de preços de transferência existentes, dentre outros. As discussões sobre este pilar estão menos adiantadas.
Já o Pilar 2 tem evoluído bastante e já faz parte da realidade de alguns países.
As regras modelo do Pilar 2 foram elaboradas para garantir que grupos multinacionais com pelo menos €750 milhões em receitas globais paguem um imposto mínimo de 15% sobre o lucro tributável em cada jurisdição onde operam. Caso os países onde operem tenham uma alíquota inferior a 15%, as empresas pagariam um valor adicional ao país em que estão domiciliadas.
Sua implementação conta com dois mecanismos principais: a regra de inclusão de renda (the income inclusion rule- IIR) e a regra de lucros subtributados (the undertaxed profits rule – UTPR), as chamadas regras GloBE – Global Anti-Base Erosion Model Rules.
A regra de inclusão de renda (IIR) representa um valor mínimo adicional à matriz do grupo, com base na proporção de participação acionária em todas as entidades que possui, de modo que cada entidade pague um imposto mínimo de 15%.
Por exemplo, o governo de determinado país estimaria a responsabilidade tributária de uma empresa matriz lá localizada com base na participação em todas as suas afiliadas estrangeiras separadamente. Para cada filial localizada em jurisdição que tenha uma alíquota efetiva de imposto de renda inferior a 15%, o país da matriz cobraria um valor adicional para elevar o imposto a 15%.
A regra de lucros subtributados serve como um complemento à regra de inclusão de renda. Ela permite que um país aumente os impostos pagos por uma empresa multinacional se esta pagar menos do que o imposto mínimo de 15% em outra jurisdição. A aplicabilidade seria através da desconsideração de deduções para aumentar a responsabilidade tributária total. Por exemplo, determinado país poderia desconsiderar deduções para pagamentos de royalties pela filial em seu país de uma empresa de outro país se, nesse outro país, a matriz pagar uma alíquota efetiva de imposto de renda inferior a 15% considerando algumas jurisdições.
Existe também a discussão se é válida a adoção de um qualified domestic minimum top-up tax – QDMTT, um imposto mínimo doméstico que se aplica às entidades locais dos grupos multinacionais. Não isenta a cobrança do imposto adicional internacional sob a Regra de Inclusão de Renda (IIR) ou a Regra de Lucros Subtributados (UTPR), mas é creditável contra esse imposto adicional. Há notícias que a Polônia, por exemplo, pretende essa implementação.
O Brasil está participando ativamente das discussões do Pilar 2, conquanto ainda não haja implementação local até o momento.
Entretanto, existem diversos desafios em sua implementação.
Isso porque, como na maioria dos países, a legislação interna brasileira tem especificidades que não necessariamente dialogam com a regra sugerida.
Nesse sentido, embora a alíquota nominal do IRPJ + CSLL seja de 34%, existem diferentes formas de apurar o lucro. Fica o questionamento de como seria a tributação das empresas que apuram o lucro pelo regime do lucro presumido, por exemplo.
Outra questão envolve as empresas que têm benefícios fiscais para o IRPJ e a CSLL que acabam por diminuir a alíquota efetiva paga, bem como aquelas que têm direito a elevadas deduções da base de cálculo dos referidos tributos.
Vale lembrar que o Brasil tem elevada carga tributária em tributos sobre o consumo, os quais a reforma tributária pretende simplificar, porém sem dar sinais de diminuição na tributação.
O assunto é relevante pois diversos países, inclusive parceiros de tratados tributários do Brasil como, por exemplo, Bélgica, Canadá, Finlândia e França, já têm legislação interna implementando algum aspecto do Pilar 2.
A equipe da área tributária do TAGD Advogados está à disposição para esclarecer eventuais dúvidas – tributario@tagdlaw.com.br.
Este informativo tributário destina-se exclusivamente a propor o debate dos assuntos que são aqui tratados, não devendo ser considerado como aconselhamento jurídico formal.
Colaboraram com a elaboração deste texto Edgar Santos Gomes e Daniel Durão de Andrade.