Controvérsia sobre a possibilidade de restituição de despesas com carta fiança e seguro garantia em execuções fiscais

As execuções fiscais são a via processual através da qual a União, Distrito Federal, Estados, Municípios e respectivas autarquias realizam a cobrança judicial de créditos inscritos em dívida ativa.

Por outro lado, os contribuintes poderão se defender da cobrança através de embargos à execução fiscal, momento no qual poderão “alegar toda matéria útil à defesa, requerer provas e juntar aos autos os documentos e rol de testemunhas”, conforme preceitua o artigo 16, § 2º da Lei nº 6.830/1980 (“Lei das Execuções Fiscais”).

De acordo com o art. 16 e §1º da citada norma, para que a oposição de embargos seja possível é necessário que o contribuinte preste caução no montante do valor da execução por meio de depósito, fiança bancária, seguro garantia ou oferecimento de bens à penhora.

No entanto, por vezes, a realização de depósito se tornar impossível ou excessivamente onerosa em razão do valor envolvido, enquanto outros oferecidos bens à penhora não são usualmente aceitos pela Fazenda Pública credora, restando aos contribuintes o oferecimento de carta de fiança ou seguro garantia para caucionamento do juízo.

No entanto, tais garantias demandam um custo para sua contratação perante as instituições fiadoras ou seguradoras, que, todavia, são suportados unilateralmente pelo executado, independentemente de seu êxito na execução fiscal. 

A falta de ressarcimento desses custos pelo Estado vai de encontro com o art. 39, parágrafo único da Lei da Execuções Fiscais, que estabelece que a Fazenda Pública, quando vencida, deve ressarcir o valor das despesas feitas pela parte contrária. 

Nesse sentido, a nova Lei nº 14.689/2023 havia alterado o parágrafo único do art. 39 da Lei de Execuções Fiscais (art. 5º da Lei nº 14.689/2023), para que constasse que a Fazenda Pública, se vencida, ressarciria integralmente o valor devidamente atualizado das despesas incorridas pela parte contrária, inclusive com o oferecimento, contratação e manutenção de garantias1

No entanto, este dispositivo foi vetado na redação final da lei, sob argumento de que alterava a sistemática da lei de execução fiscal, ao estabelecer que o seguro-garantia ou a fiança bancária só teria o condão de garantir a parte principal da dívida, sem incluir os acessórios. Ainda, se argumentou que a União não teria o controle sobre as contratações de garantia suportadas pelo sujeito passivo, nem dos valores praticados, nem da duração do processo, que influencia diretamente o valor do prêmio pago à seguradora ou encargos pagos à instituição financeira, fragilizando o processo de cobrança. 

Apesar das ressalvas suscitadas pelo legislador, fato é que a prática viola, do mesmo modo, o art. 776 do Código de Processo Civil2, que estabelece que o exequente deve ressarcir o executado pelos danos que sofreu quando a sentença declarar inexistente a obrigação que ensejou a execução. 

A Jurisprudência atual não é unânime quanto à possibilidade de ressarcimento destas despesas perante a Fazenda Pública. Há julgados nas justiças estaduais de São Paulo e Rio de Janeiro favoráveis (TJSP – Apelação nº 1505585-97.2016.8.26.0292, j. 27/10/2020; TJRJ – Apelação nº 0277301-41.2017.8.19.0001, j. 17/08/2021; TJRJ – Apelação nº 0012505-75.2016.8.19.0028, j. 22/10/2020) e desfavoráveis (TJSP – Apelação nº 1035897-78.2021.8.26.0053, j. 12/07/2023; TJRJ – Apelação nº 0135452-52.2015.8.19.0001, j. 02/08/2023) ao pleito. Na justiça federal, foram encontrados apenas julgados desfavoráveis à possibilidade de restituição (TRF2 – Apelação nº 5000919-74.2019.4.02.5001, j. 31/05/2022).

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça já se manifestou se forma desfavorável ao ressarcimento dos custos com seguro garantia (STJ – AgInt nos EDcl no REsp 2054684/SP, j. 21/08/2023; STJ – AgInt no REsp 2050113/BA, j. 15/05/2023; STJ – AREsp 2163448/RO, j. 22/11/2022; REsp 1852810/RS, j. 13/09/2022). 

Embora a jurisprudência não seja uníssona e o veto à alteração do art. 39, parágrafo único, da Lei de Execuções Fiscais demonstre certa resistência quanto à possibilidade de ressarcimento, é possível observar que a controvérsia apresentada não está encerrada, oferecendo margem para debates em ações judiciais a partir dos precedentes favoráveis. 

A equipe da área tributária do TAGD Advogados está à disposição para esclarecer eventuais dúvidas – tributario@tagdlaw.com.br.

Este informativo tributário destina-se exclusivamente a propor o debate dos assuntos que são aqui tratados, não devendo ser considerado como aconselhamento jurídico formal.

Colaboraram com a elaboração deste texto Julia Tonani e Marcelo Augusto Martins Silva. 

1 “Parágrafo único. Se vencida, a Fazenda Pública ressarcirá integralmente o valor devidamente atualizado das despesas incorridas pela parte contrária, inclusive com o oferecimento, a contratação e a manutenção de garantias.”

2 “Art. 776. O exequente ressarcirá ao executado os danos que este sofreu, quando a sentença, transitada em julgado, declarar inexistente, no todo ou em parte, a obrigação que ensejou a execução.”

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