A crescente demanda por energia, impulsionada pela expansão da economia, torna a segurança energética uma preocupação crítica. Depender de uma única fonte de energia ou de fontes estrangeiras sem diversificação adequada pode expor um país a riscos realmente significativos, sendo o fornecimento confiável de energia essencial para manter a estabilidade econômica e a segurança nacional. Portanto, a busca por fontes de energia alternativas e estratégias de diversificação torna-se essencial para garantir a segurança energética.
Junto a isso, tem-se também como prioridade a necessidade de busca por políticas energéticas eficazes e sustentáveis, assim como que garantam a acessibilidade econômica.
Não bastasse, a sustentabilidade ambiental está igualmente no centro das preocupações globais. As mudanças climáticas e os impactos ambientais negativos da produção de energia a partir de combustíveis fósseis levam a uma pressão crescente para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e adotar fontes de energia mais limpas. A necessidade de uma transição ao menos parcial para fontes de energias renováveis se tornou consenso, e a eficiência energética, nesse contexto, desempenha um papel crucial na mitigação dos impactos ambientais e na construção de um futuro mais verde.
Daí ser imperativo que governos, organizações e comunidades em todo o mundo, para ultrapassar todos esses desafios, tentem se valer das mais diversas e inovadoras estratégias com relação à gestão, em sentido genérico e amplo, dos seus recursos energéticos.
Nesta trilha é que as atenções se voltam para pilares fundamentais da política energética, em especial a segurança, sustentabilidade ambiental e acessibilidade econômica, que desempenham papel crucial na orientação das estratégias.
No Brasil, já nos deparamos com algumas iniciativas que acabam indo ao encontro desses objetivos.
Exemplo disso está no denominado Programa de Energia Renovável Social (“PERS”), que, embora não se tenha tido ainda notícias da efetiva implementação por parte das distribuidoras, foi instituído pela Lei n. 14.300/2022, de 6 de janeiro de 2022 (conhecida como o marco legal da microgeração e da minigeração distribuída).
Conforme se extrai dos artigos 36 e seguintes, o PERS consiste em um programa destinado a investimentos na instalação de sistemas fotovoltaicos e de outras fontes renováveis, na modalidade local ou remota compartilhada, aos consumidores da Subclasse Residencial Baixa Renda de que trata a Lei nº 12.212, de 20 de janeiro de 2010.
Os elementos-chave do PERS podem ser assim resumidos:
- instalação de sistemas de geração fotovoltaicos e de outras fontes renováveis: o programa estimula a instalação de sistemas de energia solar fotovoltaica bem como de outras fontes de energia renovável, como eólica, hidrelétrica de pequena escala e biomassa, que sejam adequadas para atender às necessidades energéticas das famílias de baixa renda, substituindo a sua necessidade da energia proveniente das redes da distribuidora e, por consequência, reduzindo o correspondente subsídio contido na tarifa dos demais consumidores;
- a geração de energia pode se dar na modalidade local ou remota compartilhada: os sistemas podem ser instalados nas próprias residências dos beneficiários (modalidade local) ou em locais remotos compartilhados, permitindo, nesse último caso, que maior um número de famílias tenha acesso à energia renovável;
- impacto ambiental e social: o programa tem como vantagem não apenas fornecer energia limpa, contribuindo para a redução na emissão de gases de efeito estufa e para a preservação do meio ambiente saudável, mas também promover o desenvolvimento econômico local e a criação de empregos na indústria de energia renovável.
Por um lado, o principal objetivo por trás da criação do PERS – ao menos conforme justificado no Projeto de Lei n. 5.829/2019, que deu origem à Lei n. 14.300/2022 – é a democratização do acesso e do uso da energia solar no Brasil — que até então acabava restrita àqueles que detivessem maior poder aquisitivo -, com a consequente melhoria nas condições de vida e na redução dos custos de energia para as famílias de baixa renda.
De outro lado, é de se extrair que o referido programa de investimentos implica também (a) em extensão da possibilidade de utilização de fonte renovável de energia no país, contribuindo para investimentos justamente nessa área, com a redução da emissão de carbono e das suas consequências perversas, dentre elas as mudanças climáticas; e (b) em redução de subsídios que oneram as tarifas dos consumidores como um todo, permitindo o barateamento da energia.
Isso porque, a partir da Lei n. 14.300/2022, passa a haver previsão para que parcela de recurso obtida pelas distribuidoras por meio da tarifa de energia seja direcionada aos investimentos no PERS, sendo que a utilização deve ser precedida da demonstração da redução do volume anual do subsídio correspondente à Tarifa Social de Energia Elétrica.
Inobstante a Lei n. 14.300/2022 tenha se limitado a prever que as distribuidoras promoveriam chamadas públicas para credenciamento de empresas especializadas e chamadas concorrenciais para contratação de serviços com o objetivo de implementar as instalações dos sistemas fotovoltaicos, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), no exercício da função que lhe cabe como regulador do setor elétrico (Lei n. 9.427/97), definiu a obrigação de a distribuidora realizar anualmente pelo menos uma chamada pública para credenciamento de empresas especializadas em serviços de instalação de sistemas fotovoltaicos e outras fontes renováveis e, posteriormente, chamada pública concorrencial para contratação de serviços com o objetivo de implementar as instalações dos sistemas fotovoltaicos.
Essa obrigação passou a constar da Resolução Normativa n. 1.000/2021 – ANEEL, mediante as alterações nela promovidas pela Resolução Normativa n. 1.059/2023- ANEEL, publicada somente agora em 2023.
Por não ter havido ainda tempo hábil, faz-se necessário ainda aguardar para que as distribuidoras de fato apresentem seus planos de trabalho destinados à efetiva implantação de projetos de geração fotovoltaica destinados ao PERS, e, com isso, para que seja possível verificar os seus resultados.
De todo modo, trata-se de medida que, nos parece, vai em linha com a promoção da segurança energética, sustentabilidade ambiental e acessibilidade econômica, hoje conhecidos como pilares do denominado trilema energético.