Direito à Nacionalidade Portuguesa por União Estável – Importantes impactos decorrentes do Acordão do STJ nº 10/2022

Como se sabe, a legislação portuguesa admite a obtenção da nacionalidade através do relacionamento conjugal com um cidadão português. De acordo com o art. 3º da Lei da Nacionalidade portuguesa, os estrangeiros casados ou em união estável há mais de 3 (três) anos com um nacional português podem solicitar a cidadania.

Nesses casos, o pedido de reconhecimento da cidadania deve ser encaminhado à Conservatória dos Registos Centrais, juntamente com um rol bastante extenso de documentos obrigatórios e alguns procedimentos prévios, entre eles, providenciar o reconhecimento judicial, em Portugal, da união estável.

Ocorre que havia, até bem pouco tempo, um cenário jurisprudencial bastante incerto e controverso no que diz respeito à possibilidade a revisão e reconhecimento judicial de escritura pública de união estável emitida por Cartório de Notas no Brasil. 

De um lado, o Tribunal da Relação de Lisboa se manifestava, de forma bastante consistente, favoravelmente a homologação das escrituras públicas de união estável lavradas no Brasil, de outro lado, o Supremo Tribunal de Justiça de Portugal contrariava a tendência da Relação de Lisboa, sustentando que as escrituras brasileiras não deveriam ser consideradas abrangidas pela previsão do artigo 978º nº 1, do CPC de Portugal, não podendo ser revista e confirmada para produzir efeitos naquele país.

O Supremo Tribunal de Justiça de Portugal, em sede de Recurso para Uniformização de Jurisprudência, Acórdão nº 10, de 24 de novembro de 2022, colocou uma pá de cal na divergência e decidiu que não seria mais possível homologar escrituras públicas de união estável emitidas no Brasil, pois, de acordo com o Tribunal, a lei estabelece que somente serão homologadas sentenças judiciais estrangeiras, não sendo a escritura pública elaborada por um cartório propriamente uma sentença.

O Supremo Tribunal de Justiça entendeu que o notário brasileiro simplesmente declara/certifica as declarações negociais de vontade emitidas pelos outorgantes, através das quais eles decidem viver em união estável. De tal modo, inexiste, para a autoridade judicial portuguesa, uma decisão, judicial, administrativa ou religiosa, passível de ser submetida ao processo especial de revisão e confirmação regulado nos artigos 978 e seguintes do CPC português.

Diante desse novo cenário, milhares de interessados se veem impossibilitados de ingressar em juízo em Portugal para requerer a homologação da união estável e, consequentemente, ingressar com requerimento administrativo para reconhecimento da cidadania portuguesa.

Uma alternativa viável para solucionar essa questão seria ingressar, perante o Poder Judiciário brasileiro, com um pedido de reconhecimento judicial da união estável celebrada perante um cartório extrajudicial. 

Se os argumentos forem bem articulados na petição inicial pelo advogado responsável pela causa, acreditamos que eventuais posições contrárias, como, por exemplo, (i) suposta ausência de interesse de agir (binômio adequação – utilidade) e (ii) impossibilidade de judicialização da questão já regulada por lei, poderão ser superadas com alguma segurança.

Por fim, importa salientar, rapidamente, que também existe divergência jurisprudencial quanto a possibilidade de se ingressar em juízo em Portugal para requerer a homologação de divórcio e reconhecimento de paternidade realizado em cartório extrajudicial no Brasil, por argumentos similares aos existentes para a homologação da união estável.

A equipe da área imigratória do TAGD Advogados está à disposição para esclarecer eventuais dúvidas – tributario@tagdlaw.com.br.

Este informativo tributário destina-se exclusivamente a propor o debate dos assuntos que são aqui tratados, não devendo ser considerado como aconselhamento jurídico formal.

Colaborou com a elaboração deste texto Gustavo Godoy.

OUTROS
artigos